terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

Para onde nós estamos indo?


"Para Onde Nós Estamos Indo?" é um espetáculo teatral que esteve em cartaz durante todo o mês de fevereiro no Porão da Universidade Popular - Unipop, em Belém. Além da notável interpretação de uma amiga que participava do elenco, a encenação também me chamou a atenção por propor uma reflexão sobre a perda da afetividade, a degradação massiva da figura humana, as fomes de alimento, dignidade e amor pelas quais passa o cidadão do mundo contemporâneo.
É aí que percebemos que o questionamento "Para onde nós estamos indo?" vai muito mais além do que a dimensão física e espacial do sentido de ir e vir. Para onde as nossas escolhas estão nos conduzindo? O mundo nos oferece um caminho, o sistema nos impõe padrões... Mas por que temos que aceitá-los e seguir a reta? Caminhos tortuosos sempre foram os mais atrativos, no entanto, historicamente, os evitamos por medo, comodismo, conformismo...
Para onde nós estamos indo? Atividades lucrativas, poder social, telas de LCD, estruturas de concreto e obediência doutrinária, para muitos, simbolizam o caminho mais seguro. Embora seguro, porém, não quer dizer que seja o mais sensato ou o mais saudável, psicologicamente falando. Escolhas materiais, normalmente acarretam em renúncias emocionais e consequências alienantes.
Na sociedade de hoje, a direção moral e cultural é dada pelo neoliberalismo. Essa visão exerce, desde a década de 80, um domínio quase que absoluto sobre a vida e o pensamento das pessoas. Como se ganha o coração e a mente das pessoas atualmente? Na minha percepção, é por meio da mídia. O grande aparelho do convencimento, na sociedade contemporânea, é a mídia. Coisa que não existia 100 anos atrás, quando a influência sobre as novas gerações era determinada pela família, pela escola, pelas igrejas e pelos partidos políticos. Essa é a atual disputa ideológica. Em nossos dias, quem constrói o consenso é a mídia. É assim que se constrói a hegemonia. É assim que se direciona corações e mentes.
O cidadão do século XXI é o simulacro de um homem mediano, auto-suficiente, satisfeito com tudo o que pode ter ao alcance das mãos, mas extremamente carente de idéias e sentimentos. Estamos indo em direção a uma realidade onde não se sonha, não se arrisca, não se ama, não se chora, não se demonstra fraqueza ou dúvida. Foi-se o tempo em que o futuro se encontrava no plano do abstrato e era incerto... Hoje, o destino da vida de cada um está no fim da linha reta percorrida, padronizadamente traçada.
Desde cedo, "aprendemos que para viver em sociedade controlamos e disfarçamos muitos de nossos instintos". E é aí que também perdemos a vontade própria e esquecemos que, além dos que nos são impostos, existem outros caminhos e que, se nos esforçarmos, ainda há como criar um espaço plural para todas as vozes da utopia. A utopia não morreu, a utopia não acabou. A utopia está um pouco bêbada, mas talvez esta seja uma boa ocasião para pensarmos algo diferente daquilo do que até agora pensamos, dos modos como estamos convivendo e o que produzimos com nossas lutas.

domingo, 1 de fevereiro de 2009

"Fórum do Caos Social" – O ser humano carrega o mundo nas costas

  • Diversidade

A variedade de povos e debates que compôs a programação política do Fórum Social Mundial 2009, que ocorreu em Belém/Pará/Brasil, de 27 de janeiro a 01 de fevereiro, se manifestou da cultura e também da hipocrisia. Se por um lado o Fórum ofereceu livre espaço para a manifestação tradicional de diversos grupos e discursos, por outro, o evento foi marcado por contradições, em que muitos de seus participantes e organizadores praticaram exatamente o contrário das atitudes propostas por suas ideologias.

O encontro congregou todas as tribos e todas as culturas. Em cada esquina do território do Fórum, brotavam celebrações e reivindicações que contemplaram todos os gêneros, crenças, raças e etnias. É cena para nunca mais esquecer: as ruas da UFRA e da UFPA tomadas pela heterogeneidade, local em que conviveram pacificamente o índio e o latifundiário, o proletariado e o patrão, o liberal e o conservador, o cristão e o anticristo. Acreditem, viu-se até palestinos dividindo ambiente com israelitas, americanos interagindo com vietnamitas.

  • Contradições
Durante a 9ª edição do FSM, os paradoxos estiveram por toda a parte começando pela própria administração da cidade que sediou o evento (Belém-PA) ao escolher como território para as atividades os bairros mais violentos e carentes de infraestrutura da capital. As comunidades moradoras do local, que em anos e anos viveram a mercê da falta de assistência seja no que consiste em moradia digna, seja em saúde, segurança e saneamento básico, de repente viram-se considerados, mas não em função da promoção de sua cidadania, tendo sido até mesmo segregadas da participação no Fórum, e sim pelo objetivo das autoridades de assistir e proteger o povo que veio de fora apenas pela ocasião do evento e não vive aquela realidade diariamente. Surge, então, a pergunta: por quanto tempo durarão os investimentos na área após o encerramento do Fórum Social?
Na mesma perspectiva, em contrapartida a alguns dos temas mais discutidos no FSM 2009, como as medidas a serem tomadas para o combate à pobreza e à desigualdade social, estiveram ambientalistas em favor da preservação da Amazônia produzindo toneladas de lixo, profetas do fim do capitalismo estimulando o consumo na feira livre que reuniu produtos oriundos dos mais variados países e até povos indígenas que contestam a desvalorização de suas culturas cobrando preços que oscilavam entre R$ 2 e R$ 35 para pintar figuras marajoaras no corpo dos turistas usando urucum e jenipapo, recursos naturais da floresta. Houve ainda os que clamam por uma nova consciência e juventude se alienando das discussões sociais e políticas propostas pelo evento para viver apenas os momentos de lazer e diversão no clima de Woodstok criado no acampamento de participantes.
  • O que valeu a pena?
Na hora de se questionar sobre o que ficou de bom desse acontecimento que marcou a história da Amazônia ao reunir líderes políticos de todo o mundo e mudar a rotina da cidade que conheceu as causas mais diversas de protestos que tomaram os lugares mais emblemáticos como cenários, chegamos à conclusão de que, apesar da discrepância entre teoria e prática, o ser humano ainda possui capacidade de mobilização.
Se o tema “Outro mundo é possível” foi o suficiente para atrair pessoas do planeta inteiro para um espaço de debates e contestações, ainda que muitas tenham sucumbido às fraquezas da humanidade e prazeres da civilização, talvez a real necessidade de se criar uma nova ordem mundial, um dia, faça essas pessoas compreenderem que a mudança de realidade depende da mudança de atitudes e que não é preciso um evento de proporções como as do FSM para incitar a prática de ações pelo bem-estar da coletividade e usufruto das gerações futuras. Às vezes, agir isoladamente e dar o exemplo é a única solução para que as transformações e melhorias ocorram globalmente.

Vamos fazer a nossa parte!