quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

O velho e o novo tempo

Século XXI, primeiro século do terceiro milênio. O ano é 2011. Há quem tenha vivido um reveillon moderno: na praia, nas montanhas, nas grandes cidades cosmopolitas... Como se eu tivesse voltado no tempo uns 200 anos, meu reveillon foi bem diferente. Nunca tinha imaginado coisa igual em plena pós-modernidade!

Eu que já estava preparada para a mesmice da passagem de ano em Salinópolis - PA (passo o reveillon lá desde que me entendo por gente, salvo raras exceções), onde a virada normamelte se dá em congestionamentos a caminho da praia, de repentemente, tive a oportunidade de ir para Santarém Novo - PA.

Município paraense entocado mata adentro, a 180 Km da capital Belém, saindo pela rodovia BR-316 até o trevo da Vila Nova, seguindo pela rodovia de Salinas (PA-324) até o trevo da Vila de Pau-Amarelo (PA-124). Santarém Novo tem como principal fonte de renda a extração do caranguejo. No sentido Sanlinas-Belém, está a 37 Km da saída do litoral.

A cidadela tem uma rua principal, quatro ou cinco ruas transversais, um barracão para eventos culturais, a praça da Igreja Matriz e um trapiche que dá acesso ao rio Maracanã, rio, aliás, que deu origem ao povoado em meados do século XVIII.

Dezembro, no município, é mês de festejar São Benedito, padroeiro dos humildes. A festa é tradicional e ocorre há 100 anos, pretes a ser tombada como patrimônio imaterial da cultura paraense conforme avaliação em andamento feita pelo Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN).

Além de cerimônias religiosas, procissões, ladainhas e outras honrarias ao santo, a festividade de São Benedito, como toda manifestação que mistura fé e cultura, tem um lado profano: uma quermesse organizada pela Irmandade do Carimbó de São Benedito, que dura os dez dias da quadra festiva, do dia 21 de dezembro ao último dia do ano.

São dez noites de festa, animadas pelo som do carimbó, ritmo genuinamente paraense, marcado pela batida de tambores, que mescla elementos indígenas e africanos e hoje integra o folclore nacional, estando também na expectativa pelo tombamento como patrimônio cultural brasileiro.

Na festa de São Benedito em Santarém Novo, que ocorre, é claro, no barracão da cidade, só dança o carimbó no salão homens vestidos de paletó e gravata e mulheres trajando a saia longa e rodada que embeleza o rebolado. Blusas decotadas, que mostrem os braços, barriga ou costa são proibidas, como manda a tradição. É difícil ver cena como essa na capital, onde o carimbó é tocado, em alguns lugares, sem nenhuma referência aos motivos culturais que o rodeiam.

Na noite da virada, o ritmo contagiante vem por meio dos tambores do grupo "Os quentes da madrugada". A partir das duas da manhã até o sol raiar, no primeiro dia do novo ano, os casais arrastam pé no salão. O combustível é a gengibirra, bebida a base de gengibre, cravo da índia e cachaça, distribuída gratuitamente para quem precisa de um gás a mais. A cada canção, os casais entram no salão em fila e vão dançando em círculos ao redor do salão e ao redor de si mesmos, em translação e rotação, como o planeta Terra em torno do sol.

Sei dançar o carimbó, mas aprendi na capital. O carimbó tradicional de Santarém Novo me custou uma dor nas pernas diferente, como tudo ali me causou estranhamento... um estranhamento bom, aquele que é provocado pelas novidades. Uma novidade pra mim que ao mesmo tempo é centenária para o povo do município!

Passei o reveillon de roupa emprestada, saia rodada atravessada de geração a geração pelas santarenas, e não de roupa nova como manda a superstição. Subistitui os sete pulinhos sobre as ondas por reboladas durante toda a madrugada. E, ao invés do champagne, brindei o ano novo com gengibirra! Que venha, então, 2011, e que seja tão repleto de novas experiências como foi essa virada!!!

E você, como foi seu reveillon?




Feliz ano novo a todos!!