segunda-feira, 30 de agosto de 2010

O escritor moderno e a (neo)literatura

Em mais uma Feira Pan-Amazônica do Livro, Belém do Pará movimenta o mercado editorial com títulos locais, nacionais e internacionais para todos os gostos, todas as idades, todos os bolsos... e blá, blá, blá... Quem é paraense, vive em Belém, tem o mínimo de senso crítico e já passou por uma das edições da Feira, hoje na sua XIV versão, não consegue mais ver no evento uma grande oportunidade para despertar paixões pela leitura.

Em uma região com tão poucas políticas públicas voltadas para o fomento da cultura e lazer, qualquer evento gratuito de amplo alcance é sucesso de plateia. Tudo bem que a Feira movimenta ideias, põe conhecimento em circulação, mas nem tudo ali é acessível, a não ser os best sellers em preço promocional e os shows de cantores populares ao ar livre que só reproduzem o que está na mídia.

Esse pode até ser um olhar pessimista, mas é verdadeiro. Foi-se o tempo, talvez nas suas primeiras edições, que a Feira trazia para cidade os grandes escritores e as grandes obras. Agora, eles são simples pano de fundo para uma estratégia comercial que não passa de uma imensa celebração à cultura de massa, com alguns poucos momentos que valem a pena.

Posso estar sendo apocalíptica ou conservadora demais... O fato é que hoje fui visitar a Feira e participei do bate-papo sobre literatura com o escritor Mário Prata. Fiquei um pouco decepcionada, não vou mentir, quando ele confundiu várias vezes Belém com "Natal" e que achava um absurdo jovens terem que ler "O Cortiço", do Eça de Queiroz, como leitura obrigatória para o vestibular. Tudo bem errar o nome da cidade, isso acontece, embora várias vezes seja demais. Mas, "O Cortiço", é do ALUÍZIO DE AZEVEDO!!!

O bate-papo foi um tanto quanto bizarro. Além de "ralhar" com crianças que riam na plateia e discutir com o público qual a posição sexual preferida entre homens e mulheres o que, confesso, rendeu umas boas risadas, ele disse que a literatura no vestibular é NOCIVA.

É verdade que ainda há muito a ser feito para conquistar a simpatia dos jovens vestibulandos às leituras que não deveriam ser feitas por obrigação e sim por prazer, mas como fazê-los ter acesso aos clássicos se estão rodeados pela cultura de massa???

Rever os conteúdos programáticos dos vestibulares para que passem a cobrar leituras, ainda que canônicas, mais agradáveis, menos densas e mais adequadas à realidade dos jovens é um fato que não só o Mário Prata já percebeu, como milhares de pedagogos, professores e escritores também o fizeram. A verdade é que não dá para trocar o Machado de Assis pela Stephenie Meyer, autora de "Crepúsculo", porque com ela não se aprende Língua Portuguesa!!! E ainda corre-se o risco de despertar nos adolescentes predisposições sádicas a hábitos de vampirismo...

O Mário Prata é um escritor aos moldes da Stephenie Meyer. Ele escreve crônicas e romances por encomenda. Há inovação nas suas práticas e democratização da informação, pois ele escreveu um romance inteirinho, "Os anjos de badaró", tendo como suporte um blog e uma webcam. Isso é um ponto positivo. Mas, para mim, não pareceu digno quando ele comentou sobre as vantagens de receber $$ antecipadamente para escrever trillers policiais que simplesmente divertem o público, receber $$$ para participar de eventos como o da Feira Pan-Amazônica do Livro e divertir o povo com uma imagem excêntrica, receber $$$$ para fazer do seu momento de produção literária um reality show eletrônico e divertir os internautas...

A imagem que Mário Prata me passou foi a de um escritor contemporâneo, totalmente adaptado aos padrões da Indústria Cultural. Um autor que se afasta da ideia de "autor romântico", que nasceu para escrever, pois ele mesmo revela que é matemático e, antes de se "descobrir", escritor trabalhava como economista, até que as habilidades com os números o fizeram perceber que estar entre os mais lidos pode ser um negócio bastante rentável se acopanhar as exigências da mídia.

Tudo bem, os escritores precisam sobreviver, mas, dessa forma, a Literatura perde a magia... Se os escritores não conservarem a aura à palavra escrita, não é a indústria de massa que o fará. Eu só tenho pena da nova geração, que poderá nunca entender a diferença entre Stephenie Meyer e Machado de Assis, pelo menos não até que os próprios escritores valorizem sua arte ao invés de fazer dela mera mercadoria.